Primeiramente, bom dia
"As manhãs são diferentes das madrugadas, só se pensa em miudezas e à medida que ela chega inteira começam a fugir as preocupações da noite...O que é tudo isso contra um pão bem fresco?" Nina Horta
Dos momentos mais importantes de uma vida, os inícios carregam um valor inestimável. O abrir dos olhos, o primeiro passo, a primeira marcha.
De todos os inícios que temos a oportunidade de experimentar, alguns acabam se repetindo com assiduidade. Apesar de ser uma elaboração pessoal do gosto, para mim esta é uma atividade deliciosa e insubstituível, que marca o início de todas as outras e nunca o fim: o café da manhã. Será inclusive que é a oportunidade do primeiro aviãozinho, será que é no café da manhã que um bebê desmamado recebe sua primeira colher de papinha? Momento importante.
A toada do café da manhã é particular. Há quem sacrifique esse simples prazer em troca de mais alguns minutos de sono e acabe acordando atrasado, o que não deve ser bom nem pra alma nem pro coração. Quem já se levantou no susto e saiu de casa com o coração, o pão rasgado e o mal hálito na boca sabe do que estou falando. Nesse caso, a melhor solução é optar pelo simples e eficaz cafezinho preto passado na hora, ele sempre coloca os nossos ponteiros de volta no lugar e sobrepõe qualquer aroma indesejado na fala. Mesmo que cada dia te exija um comportamento, o cafezinho nunca te abandona.
Para os que acordam cedo e se atrasam com calma, essa refeição é uma etapa importante do despertar. Semana passada foi assim aqui na casa dos meus pais, onde estou passando as férias. Substituí o caminho de mesa pela toalha do dia; posicionei quatro pratos, quatro pires, quatro xícaras com o mínimo de impacto possível; dei bom dia pro cachorro que me levou até a padaria na melhor hora do dia; voltei pra casa sem outros quitutes, preferi a simplicidade de quatro pães fresquinhos; passei o café (sempre com uma pitada de canela) com a dúvida diária da proporção de pó para água, mas ignorei qualquer risco quando um dos aromas mais apreciados do planeta invadiu a cozinha. Degustei os miolos de pão com requeijão, meu livro aberto e uma xícara meio cheia meio vazia. Agora era só esperar os ruídos das portas, os estalares dos passos, os pingos das torneiras e desejar primeiramente, bom dia.
Apesar de o sol raiar para todos, cada um começa de um jeito. Como eu sou da turma dos bem-humorados, vou ignorar os que desprezam o bom humor matinal. Dentre os felizes, há quem acorde com o ronco da própria barriga e coma muito logo após acordar. Tive um amigo na faculdade, hoje bem pesado, que comia arroz, feijão e bife requentados. Eu já comi sete pães franceses de manhã, mas nunca um PF. Há quem coma todos os componentes da pirâmide alimentar, a torrada de pão com queijo minas e presunto, a frutinha, o iogurte com mel. Essa sou eu quando hospedada em um hotel, inclusive faço a reserva só se aprovar as fotos da mesa do café, faz parte do luxo. Há também quem não consiga comer logo ao acordar, metabolismo enjoado. Também já fiz isso várias vezes, mas me comprometi na refeição seguinte, tento evitar esse ato-falho. Já fui da fase do pão com manteiga molhado no leite morno, da banana amassada com mel e aveia, do sucrilhos com iogurte de morango, da tapioca com chia e ovo mexido, da bolacha de arroz com pasta de amendoim. Pão na chapa da padoca de esquina? Sim, por favor. Cuzcuz com queijo coalho? Sim, por favor. Vitamina de abacate? A melhor que existe. Pastel com garapa na feira? Não recuso. Bolo de fubá com goiabada? Feitos pra mim. O único item que nunca caiu de moda no meu vasto cardápio foi o café coadinho, mesmo que antes ou depois eu tome um chá.
Em cenas clássicas do cinema e da televisão, a mesa do café da manhã é ornamentada com um homem bigodudo sentado na ponta, quase sempre sozinho, com uma infinidade de opções de comidas intocadas em potinhos de cristais à sua frente, lendo um jornal e segurando uma xícara. Sinceramente eu nunca vi uma cena dessas ao vivo. Acho uma delícia ter a mesa recheada e um tempo para ler enquanto aprecio os primeiros goles do dia, especialmente em minha própria companhia, mas um jornal é um negócio grande, desengonçado, e meio sujinho. Jamais carimbaria meu pão de queijo com a manchete de capa ou os anúncios dos classificados.
Outra coisa que acho que não combina é chamar café da manhã de desjejum. Que palavra mais desgostosa, desinteressante, desnecessária. Outra coisa, não venha se sentar ao meu lado caso esteja afim de fazer uma colação. Cola, colagem, aula de artes, ensino fundamental, escolinha, é pra lá que precisa ir se quiser fazer uma colação, ora bolas.
Sugiro a leitura deliciosa de uma crônica de Nina Horta, Para começar bem, café da manhã.
Sou do time dos que acordam cedo para me atrasar com calma. kkkkk
Leitura deliciosa, mah! Amei.